Uma mulher de blazer preto segura uma camisa verde com um símbolo de reciclagem, exibindo sustentabilidade na indústria agrícola. Ao fundo, um homem e uma mulher sentam-se à mesa em um escritório moderno adornado com plantas e decoração com tema de reciclagem, criando uma atmosfera brilhante e ecológica. - Efacont

Cientistas da Universidade de Coimbra receberam um financiamento de 1,4 milhões de euros da Fundação Calouste Gulbenkian para desenvolver um protótipo industrial inovador que visa mitigar a poluição gerada pela indústria têxtil.

O avanço tecnológico, para além de reduzir a utilização de corantes, também diminui significativamente o consumo de água e energia no processo de tingimento dos tecidos.

Sustentabilidade na Indústria Têxtil: Impacto Ambiental

Jorge Pereira, professor do Departamento de Engenharia Química da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, destaca a elevada quantidade de resíduos químicos libertados durante o processo de tingimento de tecidos. Segundo o investigador, mesmo no uso doméstico, já era habitual lavar separadamente peças de vestuário recém-adquiridas para evitar a transferência de corantes para outras roupas.

No entanto, quando este fenómeno ocorre à escala industrial, o impacto torna-se significativamente mais preocupante. O professor explica que, no primeiro tingimento de um tecido, pode ocorrer a libertação de uma percentagem substancial dos corantes utilizados, variando entre 50% e 70%. Estes valores evidenciam a ineficiência do processo tradicional e a necessidade urgente de encontrar soluções tecnológicas que minimizem tanto o desperdício de produtos químicos como a poluição ambiental.

Os processos industriais de tingimento e enxaguamento de tecidos recorrem a uma vasta gama de substâncias químicas, como corantes, pigmentos, agentes de fixação, tensioactivos e sais, todas essenciais para conferir cor e durabilidade ao produto final. No entanto, uma parte significativa destes compostos não é completamente absorvida pelo tecido, acabando por ser descartada nos efluentes industriais. Quando estas substâncias são lançadas no meio ambiente sem um tratamento adequado, podem contaminar cursos de água e reservatórios naturais, comprometendo a qualidade da água e colocando em risco a saúde humana.

Além disso, a presença destes resíduos nos ecossistemas aquáticos pode afectar a biodiversidade, interferindo no equilíbrio natural e provocando consequências graves para a fauna e flora. A acumulação de substâncias químicas tóxicas na água pode ainda dificultar a sua reutilização para consumo humano ou agrícola, tornando essencial a adoção de estratégias mais sustentáveis no sector têxtil.

Uma solução inovadora

Jorge Pereira afirma que a tecnologia desenvolvida pela sua equipa permite recuperar os corantes presentes nos efluentes industriais e reutilizá-los no processo de tingimento de tecidos. Esta solução reduz a quantidade de corantes descartados e torna o processo mais sustentável. A reutilização dos corantes diminui a necessidade de adquirir novos produtos químicos, o que representa um benefício económico para a indústria. O investigador explica que, ao evitar a libertação de substâncias poluentes nos cursos de água, esta abordagem contribui para a redução da carga poluente lançada no meio ambiente.

Além disso, permite diminuir os custos do tratamento das águas residuais, um processo que exige elevados recursos energéticos e financeiros. A implementação desta tecnologia possibilita poupanças consideráveis, não só na utilização de corantes, mas também no consumo de água e energia ao longo da produção têxtil.

Os corantes e outros produtos químicos utilizados na indústria têxtil têm um impacto ambiental significativo e representam riscos para a saúde humana. Muitos destes compostos são substâncias tóxicas, com efeitos cancerígenos e mutagénicos, o que levanta preocupações quanto à sua presença nos ecossistemas aquáticos e nos recursos hídricos para consumo.

Estudos indicam que a indústria têxtil é responsável por cerca de 20% da poluição global da água potável. A acumulação destas substâncias em rios e lagos compromete a qualidade da água e dificulta os processos de tratamento, agravando os desafios ambientais e de saúde pública. A adoção de práticas mais sustentáveis no sector têxtil é essencial para minimizar os impactos ecológicos e reduzir os riscos associados à exposição prolongada a estes agentes químicos.

Tecnologia patenteada e o desenvolvimento do protótipo

O projeto DyeLoop – Tecnologias Circulares para o Tingimento Têxtil baseia-se numa tecnologia inovadora desenvolvida e patenteada por investigadores da Universidade de Coimbra, concebida para tornar o processo de tingimento mais sustentável. Através deste sistema, os corantes têxteis são eficazmente separados dos efluentes industriais, permitindo a sua recuperação e reutilização em novos ciclos de produção.

Simultaneamente, a água utilizada no tingimento é tratada e reintegrada no processo, reduzindo significativamente o consumo de recursos e minimizando os impactos ambientais. O projeto visa criar um modelo de produção circular, onde o desperdício é reduzido ao mínimo e a poluição industrial é atenuada de forma eficaz.

Com o financiamento agora assegurado, a equipa de investigadores tem como meta alcançar uma melhoria mínima de 50% na eficiência do consumo de água e corantes, otimizando os processos utilizados na indústria têxtil.

O grupo de trabalho, atualmente composto por quatro investigadores pós-graduados, encontra-se em fase de crescimento e prevê a integração de novos membros. O objetivo é expandir a equipa para um total de 12 investigadores ao longo do desenvolvimento do projeto, garantindo o avanço e a implementação eficaz da tecnologia em ambiente industrial.

O protótipo industrial a ser desenvolvido terá características idênticas às das unidades de tingimento convencionais, permitindo uma aplicação prática na indústria têxtil. Para assegurar a eficiência do processo, o sistema incluirá um extrator especializado, responsável pela separação dos corantes da água, facilitando a sua recuperação e reaproveitamento. Esta abordagem permitirá uma redução expressiva da carga poluente presente nos efluentes industriais, contribuindo para um modelo de produção mais sustentável. Ao possibilitar a reutilização contínua de água e corantes, o DyeLoop poderá representar uma mudança significativa na forma como a indústria têxtil gere os seus recursos e resíduos, promovendo a adoção de práticas ambientalmente responsáveis.

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Parcerias e perspetivas futuras

Durante os próximos três anos, a equipa de investigadores irá aprofundar o desenvolvimento de soluções biotecnológicas que permitam tornar a produção têxtil mais sustentável, explorando alternativas inovadoras para a criação de tecidos com menor impacto ambiental. O objectivo passa por optimizar processos e materiais, reduzindo a dependência de produtos químicos agressivos e promovendo métodos mais eficientes no consumo de água e energia.

Paralelamente, o projeto pretende reforçar a ligação entre a investigação académica e o sector têxtil português, com especial enfoque na região industrial da bacia do rio Ave, uma das mais representativas da indústria têxtil nacional.

A equipa procura estabelecer colaborações estratégicas com empresas do sector, de modo a facilitar a implementação da tecnologia em ambiente industrial, criando oportunidades para a adoção de processos produtivos mais sustentáveis e competitivos. Estas parcerias serão fundamentais para validar e ajustar a tecnologia às necessidades reais do mercado, garantindo a sua viabilidade comercial e a sua aplicação em larga escala.

A primeira fase do projeto decorreu entre 2023 e 2025 e foi determinante para o desenvolvimento da tecnologia que agora se pretende aplicar à escala industrial. Durante este período, a investigação resultou no registo de uma patente, assegurando a proteção da inovação desenvolvida.

O trabalho foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e contou com a colaboração do Instituto Indiano de Tecnologia de Madras (IIT Madras), uma instituição de referência na área da engenharia e tecnologia. Esta parceria internacional permitiu aprofundar o conhecimento técnico e testar abordagens complementares, enriquecendo o processo de investigação e abrindo portas para futuras colaborações no âmbito da inovação sustentável na indústria têxtil.